Esta sexta-feira (5), dia em que teria início o São 2020 de Campina Grande, marcará, como é de costume, a vida de quem trabalha direta ou indiretamente com a festa. Neste ano, no entanto, a data que deveria ser sinônimo de felicidade proporcionada pela simbologia do evento cedeu espaço para sentimentos que revelam preocupação, incerteza e lamentação. O som de celebração feito pelos fogos de artíficio que marcam a abertura do festejo será substituído pelo silêncio da dúvida sobre o que está por vir.
Por causa da pandemia da Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, a edição deste ano dos festejos juninos da cidade foi adiada para o mês de outubro. A medida foi anunciada em março, pelo prefeito Romero Rodrigues (PSD), como ação preventiva ao aumento de casos confirmados e mortes provocadas pela infecção.
Para a data não passar em branco, a empresa organizadora do evento, vai realizar lives beneficentes para três os dias 23, 24 e 27 de junho. Pelo menos 17 artistas vão se apresentar nas transmissões, que já têm programação divulgada. Parte das doações arrecadas será destinada para barraqueiros.
Joseilda Santos é uma das comerciantes que amarga os prejuízos causados pela pandemia na cidade. Há 23 anos, ela vende drinks no Parque do Povo, local que sedia a festa. Conhecida pelo acolhimento caloroso e pela alegria, ela não escondeu a tristeza que sente em não poder trabalhar com o que ama.
“Ontem mesmo fui até o Parque do Povo e me acabei no choro. São João não é só trabalho, é diversão, é família. Não são clientes que eu ganho, são amigos que eu faço”, desabafou.
Como trabalha com eventos e também na área de alimentação durante o resto do ano, a renda da família foi comprometida, já que ela cumpre cuidadosamente as medidas de isolamento social recomendadas autoridades em saúde.
“Eu tenho muita fé, não é só expectativa. É o Natal para mim. O décimo terceiro [salário] décimo quarto, a agente vive da festa. Para a gente que não tem nada, é uma chance de se reerguer”.
Não é a primeira vez que ela passa por obstáculos durante o período junino. Em 2018 ela presenciou o incêndio que destruiu parte da estrutura da festa. Há dois, Fia, como é carinhosamente chamada, viu o perigo de perto, mas também enxergou o espaço para o recomeço como único cenário possível, assim como agora.
A comerciante se apega à fé para acreditar que o evento ainda será celebrado este ano.
“A gente não pode pensar só na gente, mas nas outras pessoas também. A gente vai se recuperar. O são João traz muitas coisas boas: estabilidade, é o que eu tenho, tudo para mim”, concluiu.
De acordo com o presidente da Associação dos Barraqueiros do Parque do Povo, Lucinei Cavalcanti, a categoria será uma das mais afetados com a não realização do São João em junho.
Segundo a associação, pelo menos 200 comércios fixos são instalados no Parque do Povo, entre quiosques, barracas e pavilhões e 50 ambulantes só na área de shows, além dos vários outros que ficam dentro da área.
“Nós, comerciantes, geramos emprego e renda para diversas categorias profissionais, entre garçons, atendentes, cozinheiros, auxiliares de cozinha, equipes de segurança e limpeza, e outras. Todos esses trabalhadores estão sendo diretamente atingidas”, explicou.
Ainda conforme Lucinei é necessário que as autoridades possam buscar formas de ajudar as pessoas afetadas. “Esperamos o ano todo pelo mês de junho”, prosseguiu.
O representante também fez uma cobrança à Medow Promo, empresa organizadora da festa, para que os valores que já foram pagos pelos comerciantes sejam devolvidos, mas que a garantia do direito do comércio no local seja mantida. Segundo ele, os pagamentos foram antecipados e a empresa realizadora informou que o dinheiro pode ser devolvido desde que os comerciantes assinem um terno de recebimento do valor, que não garante a participação deles na próxima edição.
Em nota, a Medow Promo disse que foi enviado um documento para a associação, informando sobre quais procedimentos devem ser feitos para devolução dos valores e disponibilizou contatos por e-mails e telefone para que os comerciantes que tenham interesse, façam a solicitação. O atendimento será remoto para evitar aglomerações de pessoas.
Ao G1, o prefeito Romero Rodrigues informou que existe a intenção de ajudar as categorias que atuam diretamente no evento, inicialmente com os ambulantes e músicos. No entanto, ainda não há ações definidas.
Trio de forró passa pelo primeiro São João sem shows em 16 anos
Responsáveis por proporcionar alegria em forma de música, os artistas que se compõem trios de forró também foram prejudicados. Após quase 16 anos desde a formação do grupo, o trio de forró pé-de-serra “Forró Campina” vai passar pelo primeiro mês de junho sem shows. A realidade é muito diferente de outros anos, em que fizeram mais de 60 apresentações, durante os 30 dias do mês.
O grupo tradicional atualmente é formado por três campinenses, Erivan Ferreira, o zabumbeiro; Jimmy Allisson, cantor; e Dinho Lima, o sanfoneiro. Eles são conhecidos por tocar na Feira Central de Campina Grande.
Erivan, de 46 anos, é zabumbeiro e professor de música no curso de percussão regional na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB). Segundo ele, em 30 anos de carreira, esse também será o seu primeiro São João sem tocar.
O zabumbeiro lamentou a situação dos músicos campinenses, já que o São João de Campina Grande é o maior e mais rentável evento da cidade para a categoria.
“Enxergo com muito prejuízo, principalmente, para os músicos que vivem disso. Do início das prévias em maio, até o mês de julho nas festas recordando o São João, é o período que mais podemos trabalhar”.
Apesar da tristeza desse ano, pelo grupo e pelos demais companheiros da música, o músico é otimista e já está na expectativa para o mês de junho de 2021.
“Primeiro, pedir saúde e ano que vem corremos atrás de alcançar mais sucesso”, concluiu.
Adiamento do São João afeta quadrilhas juninas
As quadrilhas juninas, símbolos do ritmo aconchegante do São João, também foram afetadas e passaram por mudanças de planos. Segundo a Associação de Quadrilhas Juninas de Campina Grande e Região Agreste (Asquaju-CG), a cidade conta com 24 grupos e 3,2 mil quadrilheiros.
Os meses dedicados ao empenho de fazer verdadeiros espetáculos deram espaço para o vazio de não saber o que virá pela frente.
Mesmo compreendendo o momento que exige prevenção, os quadrilheiros não escondem a dificuldade de aceitar passar um ano distantes do que amam fazer: dar cor, luz e brilho para os festejos juninos.
À TV Paraíba, a prefeitura de Campina Grande informou que o setor é responsável por movimentar pelo menos 1,5 milhão por ano. Alguns profisisonais contam com a renda que a atividade gera no período junino.
Maria Suely dos Santos é uma dessas pessoas. Ela confecciona figurinos para uma quadrilha há 30 anos.
“A minha renda é costurar. Depois da pandemia sumiu tudo. Não temos costura, não temos clientes, não temos mais nada. Infelizmente, nem nossa quadrilha vamos ter”, desabafou.
Comércio campinense fecha vagas ao invés de abri-las
O período junino é sinônimo de vendas para o comércio de Campina Grande. Segundo a assessoria de comunicação da Câmara de Dirigentes Logistas (CDL) da cidade, a data a que representa o segundo maior número de vendas no ano, em segmentos como os de vestuário e acessórios.
No São João 2019 o comércio campinense abriu entre cerca de 300 vagas de emprego formais e informais em lojas localizadas no Centro e shoppings da cidade. Já em 2020, o setor também amarga o fechamento de 427 vagas com carteira assinada somente no mês de abril, conforme dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED).
Ainda conforma a CDL, a expectativa não é positiva já que o comércio continua fechado e sem perspectiva de retorno das atividades. Sendo assim, a previsão é de que o número de vagas fechadas dobre ou triplique dependendo da continuidade da suspensão dos serviços.
Setores de hotelaria e alimentação registram pelo menos 800 demissões
Os setores de hotelaria e de alimentação já estão sendo afetados pelo adiamento ou até não realização da festa, segundo o presidente do Sindicato de Hospedagem e Alimentação de Campina Grande (Sindcampina), Divaildo Júnior.
Pelo menos 800 pessoas foram demitidas entre abril e maio em Campina Grande, nos dois setores, após os decretos de fechamento de hotéis e restaurantes, conforme o sindicato.
Segundo Divaildo, a previsão é de que as demissões continuem acontecendo já que, no mesmo período, em outros anos, os hotéis chegaram a 100% de ocupação em alguns dias do mês de junho. Durante todo o mês, o percentual de ocupação varia entre 70% e 80%.
“No setor hoteleiro, principalmente, é muito difícil trabalhar com incertezas, já que não se pode prever quando o evento irá acontecer. Alguns restaurantes têm aderido ao serviço delivery, mas não se sabe como será o pós pandemia”, afirmou.
Consenso
A pandemia não está sendo fácil para quem respira os 30 dias de festa do São João de Campina Grande. Mas para todos que fazem o evento, a compreensão é o consenso necessário para salvar vidas.
Não haverá milho verde, forró em palhoças, dezenas de pessoas disputando um metro quadrado. Mas, mesmo que pela internet, quem admira a festa não vai deixar de vivê-la intensamente, como sempre fez. Além do amor que sempre foi dedicado, fica a esperança de poder vivenciar, em breve, o calor humano que o evento é capaz de proporcionar.
“Agora só podemos pedir saúde para a nossa família para que todos voltem a comemorar [o São João]”, finalizou Franceiilda.
Programação de lives beneficentes do São João 2020 de Campina Grande é divulgada
Foi divulgada nesta terça-feira (2) a programação de lives beneficentes do São João 2020 online de Campina Grande. De acordo com o anúncio feito pela realizadora do evento, 17 artistas vão se apresentar nos dias 23, 24 e 27 de junho. A programação, que vai ser transmitida no canal do evento no YouTube, tem Elba Ramalho, Cavalo de Pau, Cavaleiros do Forró, Batista Lima, Três do Nordeste, entre outros.
No dia 23 de junho, véspera de São João, quem se apresenta é Elba Ramalho, que faria um show no Parque do Povo nesta mesma data. Também vão se apresentar neste dia Eliane, Walkiria, Fabrício Rodrigues e Gitana Pimentel.
No dia de São João, 24 de junho, a live vai ser com Cavalo de Pau, Aduílio Mendes, Banda Cascavel, Iohannes, Fabiano Guimarães e Felipe Warley.
Já no dia 27 de junho, se apresentam Cavaleiros do Forró, Batista Lima, Ney Alves, Pedrinho Pegação, Três do Nordeste e Estela Alves. Originalmente, esta live seria no dia 28, véspera de São Pedro, mas a data foi antecipada.
Além das apresentações dos artistas, também vai ser contada uma parte da história dos 37 anos do São João de Campina Grande, com temas como quadrilhas, gastronomia e a preparação do Parque do Povo para os shows em outubro.
O prefeito de Campina Grande, Romero Rodrigues (PSD), informou que além de manter a tradição junina, a ideia das lives é também arrecadar alimentos para instituições de caridade do município e para barraqueiros e ambulantes que dependem da renda do São João para se sustentar.
Fonte: G1 PB